segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

Site de Mapa Mundial da Doença Falciforme: uma alternativa para sabermos quantos somos e onde estamos


O texto abaixo fiz para colocar numa página, cujo a intenção achei ótima: gerar dados, num mapa mundial, para saber quantas pessoas existem com "X" patologia, neste caso, a Doença Falciforme.

Para que isso aconteça depende de que as pessoas acessem o mesmo e se cadastrem, preenchendo alguns dados solicitados. Há inclusive um espaço de interação, onde podemos trocar mensagens com as pessoas inscritas. Até o presente momento temos apenas 32 pessoas cadastradas, mundialmente, poucas no Brasil.

O site também contabiliza e gera dados para quem é da área da saúde e entende da patologia, ou quem tem familiares com a patologia. Se você é responsável por alguém com Doença Falciforme, também pode preencher o site. Gostaria muito de vê-lo repleto de bonequinhos nos representando ali.
Sei que somos muitos! Mas para que o site atinja o seu objetivo, precisa ser conhecido e divulgado.

Colocarei aqui o link, e caso você chegue até aqui e se interesse, acesse e se inscreva. Divulgue também, se puderem e quiserem, mandem este link por email para que seus contatos o conheçam.

Coletivamente, sempre poderemos mais e seremos mais. 








Meia lua em mim

Fui diagnosticada aos 2 anos de idade. Minha mãe estava grávida de mim quando perdeu seu filho de um aninho para a doença falciforme, ele teve um sequestro esplênico do baço. Quando diagnosticada, o médico disse a minha mãe que ela "não precisava se apegar a mim, pois provavelmente, como aconteceu com seu outro filho, eu não chegaria aos 5 anos de idade". E infelizmente, muitos que nasceram no mesmo período ou anteriormente a mim, ouviram coisas semelhantes. Aos meus sete anos, minha mãe teve um outro filho, Alex, que nem chegou a celebrar um aninho de vida. Também teve a vida ceifada com sequestro esplênico do baço, mas desta vez a perda veio com diagnóstico e acompanhamento, mas a morte ainda veio por descaso.
Passei a minha infância entre hospitalizações constantes e novas previsões de que idade eu não alcançaria. Ultrapassei todas. Hoje estou com 37 anos, e sigo muito bem obrigada.
Quando se tem uma doença crônica, e não precisa ser somente a falciforme, a gente aprende muitas coisas que outros não se atentariam. Ampliamos em nós o amor à vida, a valorização das coisas, dos pequenos momentos, dos dias sem dor, enfim. Não que necessariamente a gente precise ter uma patologia para valorizar a vida, mas é quase certeza de que quem tem, valorizará muito mais.
Eu tenho muita sorte de ter nascido na família em que nasci. Recebi desde sempre muito apoio, amor, dedicação, cuidado, mas sem exageros, sem superproteção. Embora pai e mãe sempre tentem de uma forma ou de outra nos superproteger. Mas aprendi com eles a ser quem sou. Minha mãe nunca deixou que eu me sentisse inferior a ninguém por ter o que tenho. Ao contrário, sempre valorizou mais as minhas conquistas por conta disso. Assim como o meu pai.
Minha trajetória até aqui não foi nada fácil. Sempre abri mão de muitas atividades prazerosas por saber que interfeririam em minha saúde. Mas ao mesmo tempo não deixei de viver e nem de fazer outras coisas que eu sabia ser possível. As crises de dor surgem mesmo quando estamos sob total cuidado. Então, deixar de viver ou realizar algo por medo de que você entre em crise é algo que sim permeia o nosso consciente, mas que não deve nos restringir. Eu já até tomei banho de cachoeira. Sonho de muitos que convivem com a falciforme. Pois devido a água ser gelada, normalmente é crise na certa. Mas sinceramente, muitas vezes é melhor ter uma crise fazendo algo de que se gostaria muito, do que tê-la em casa, sem ter feito absolutamente nada que pudesse tê-la causado. Pelo menos após o feito, vem o prazer de poder dizer: ao menos consegui. Realização é muito importante para todos. Não dá para deixar também de realizar as coisas por medo do que virá depois. Há que se tomar os devidos cuidados e ir em frente, tendo medo ou não.
Estudei, tive dificuldades em concluir o superior devido às constantes internações. E após melhora na condição de minha saúde, acabei deixando de lado a questão do superior, mas vez ou outra sinto vontade de concluir. Só para sentir a satisfação de dizer: consegui. Até meus 45 quem sabe eu concluo.
Na educação básica e de nível médio sempre contei com alguns amigos e professores que me auxiliaram para que eu não perdesse o conteúdo devido às internações. Mas nem sempre isso acontece. Tenho muitos amigos que convivem com a doença falciforme e que não conseguiram concluir o ensino médio ou o básico. Assim como tenho muitos outros com graduação, pós graduação, doutorado e até mestrado. Todos somos capazes. Só precisamos ter nossas necessidades atendidas e respeitadas, seja na vida social, estudantil, profissional... em todos os campos de nossa atuação.
Já exerci por oito anos a profissão de educadora infantil, ou professora de educação infantil. Era concursada e tive que brigar para garantir o meu direito a vaga. Já que os peritos médicos me disseram que eu era "incapaz de ser producente", que "não possuía capacidade laborativa devido à falciforme", que " minha hemoglobina baixa me impedia de fazer qualquer coisa, que já era um milagre eu estar viva, quem dirá querer trabalhar", que " só prestei o concurso para mamar nas tetas do governo enquanto passaria o restante da vida correndo atrás de uma aposentadoria, que me seria negada caso eu realmente assim o fizesse". E foi no terceiro recurso que consegui uma posição a meu favor e entrei no cargo que concursei. Mas devido às mudanças nos rumos da vida, me vi depois de oito anos em atuação, exonerando o cargo. Para viver um sonho, num outro estado, e buscar ser feliz. Fui morar sozinha por um ano e meio. Não deu muito certo, voltei a morar com meus pais. Após certo tempo, voltei a me lançar no mundo. E aqui estou, acompanhada, amada e feliz, em outro estado novamente.
Hoje minha profissão é artesã. Amanhã, pode ser que seja outra. A vida é essa constância de transformações.
Não me permito deixar de fazer algo por medo. Faço com medo e tudo. Não será uma patologia ou qualquer outra coisa que ira limitar o que devo ou não fazer. É claro que eu respeito os meus limites. E respeitando-os sei que posso ir sempre além. Se não me sobrecarrego, consigo aproveitar ainda mais tudo o que preciso aproveitar para ser feliz e estar bem.
Cresci com a dor, e a dor me ensinou a respeitar a transitoriedade da vida. Tudo está em constante mudança e transformação. Tudo realmente passa. Aprendi com a dor a ver também as coisas melhores que a dor. Aprendi com a dor a amar cada segundo sem ela. Aprendi a poetizar a dor. Aprendi a poetizar a vida. Aprendi que o que era foice em mim, provocando transtorno, hoje é meia lua, me inundando de brilho, luz e possibilidades.

A todos vocês meus irmãos de meia lua, desejo sucesso e realizações, muita saúde, amor, conquistas, paz, luz e muita Vida!